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Factual

Expoente da lógica contemporânea, Newton da Costa morre aos 94 anos

Professor emérito da Unicamp contribuiu para dar visibilidade à ciência brasileira no exterior

Morreu nesta terça-feira (16), aos 94 anos, o filósofo, lógico e matemático Newton da Costa, professor emérito da Unicamp e um dos maiores nomes da ciência brasileira. Newton da Costa foi o formulador da lógica paraconsistente, uma das vertentes da lógica contemporânea que se opõe aos princípios da lógica clássica ao admitir contradições dentro de sistemas lógicos. Suas ideias tiveram grande repercussão em áreas como a filosofia das ciências, a matemática, a física, a economia e o direito, entre outras. Ao longo de sua carreira, publicou cerca de 250 trabalhos, entre artigos, livros e notas, foi professor visitante e ministrou conferências em universidades nas Américas, na Europa, na Ásia e na Oceania e orientou uma geração de cientistas e pensadores que, hoje, levam seu pensamento  adiante. Seu corpo será sepultado às 17h30, em Florianópolis (SC), onde morava com a família.

“Essa é uma perda muito grande para o país. Newton foi fundamental para o desenvolvimento da lógica no Brasil e para o reconhecimento que a escola brasileira de lógica paraconsistente tem no cenário internacional”, lamentou Ítala D’Ottaviano, pesquisadora colaboradora do Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência (CLE) da Unicamp, unidade da qual Newton da Costa foi um dos fundadores e na qual trabalhou como pesquisador. D’Ottaviano recorda-se dos conhecimentos que obteve dele como sua orientanda de doutorado, defendido em 1982. “Todos que estudaram com ele beberam de seu gosto pela lógica e de sua alegria por pesquisar e ensinar. Newton era um grande pensador e também um grande professor”, destacou.

Newton da Costa durante entrevista online, em fevereiro de 2023: inspirações para formular a teoria havia sido a grande quantidade de contradições existentes no mundo, com as quais a ciência precisa lidar
Newton da Costa durante entrevista online, em fevereiro de 2023: inspirações para formular a teoria havia sido a grande quantidade de contradições existentes no mundo, com as quais a ciência precisa lidar

Nascido em 1929, em Curitiba, Newton Carneiro Affonso da Costa formou-se em Engenharia e em Matemática pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), local onde, em 1961, obteve o título de doutor em análise matemática e análise superior, tornando-se professor catedrático. Foi professor titular da Universidade de São Paulo (USP) e da Unicamp. Aqui, participou da criação do Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência (CLE), primeiro órgão interdisciplinar da Universidade, em 1977. Em 2009, recebeu o título de professor emérito na Unicamp. Nos últimos anos, trabalhou como professor visitante da Universidade Federal de Santa Catarina e participou frequentemente de eventos científicos.

Entre suas ideias mais consagradas, está a da lógica paraconsistente. Assim como outras vertentes não clássicas, ela contraria os princípios da lógica aristotélica ao admitir a existência de contradições dentro de sistemas lógicos. Em entrevista concedida ao Jornal da Unicamp no início de 2023, Newton da Costa contou que uma de suas inspirações para formular a teoria havia sido a grande quantidade de contradições existentes no mundo, com as quais a ciência precisa lidar. “Por exemplo, a mecânica quântica tem, no mínimo, cerca de dez teorias que se opõem. Embora levem, empiricamente, aos mesmos resultados, teoricamente elas se contradizem. Na realidade, toda atividade científica tem sempre algum problema por trás”, afirmou na ocasião.

Graças a sua proeminência no campo das ciências, Newton da Costa conquistou diversos prêmios, como o Prêmio Jabuti em Ciências Exatas (1995), a Medalha da Ordem do Pinheiro do Governo do Estado do Paraná, por mérito científico (1996), a Medalha do Mérito Científico “Nicolau Copérnico”, outorgado pela Universidade de Torun, na Polônia (1998), a Medalha do Mérito Científico da Universidade Federal do Paraná (1998) e o título de Doutor Honoris Causa da Universidade Federal de Santa Catarina (2010). Também integrou importantes sociedades científicas, tendo sido o primeiro brasileiro a participar da Academia Internacional de Filosofia da Ciência, sediada na Bélgica, e do Instituto Internacional de Filosofia, na França.

“Newton foi um grande encorajador, uma pessoa que encorajava muito nossos pesquisadores”, relatou Walter Carnielli, pesquisador colaborador do CLE que também foi orientado pelo filósofo em seu doutorado. “Imagine, há 35, 40 anos, o complexo de vira-latas que os pesquisadores brasileiros tinham… Ele nos encorajava a produzir ciência em pé de igualdade com os [pesquisadores] norte-americanos e europeus, nos punha para cima.”

Newton da Costa ao entrar no Centro de Convenções para receber o título de professor emérito; à esquerda Walter Carnielli e à direita, a professora Ítala D'Otaviano
Newton da Costa ao entrar no Centro de Convenções para receber o título de professor emérito; à esquerda Walter Carnielli e à direita, a professora Ítala D’Otaviano

Carnielli também destacou a alegria de conviver com Newton da Costa por mais de 50 anos. “Conhecia o professor Newton desde os anos 1970. Chegamos a ser vizinhos na época em que ele era professor visitante e eu, um jovem pós-doutorando no Departamento de Matemática da Universidade de Berkeley, na Califórnia [EUA]. Éramos muito amigos, nossas famílias conviviam”, recorda o professor, lembrando também o quanto a cordialidade e o bom humor de Newton da Costa eram qualidades que conquistavam a todos. “Apesar da seriedade e da imensa importância do que realizava, ele era uma pessoa que não se levava tão a sério, não assumia um verniz de autoridade. O Brasil precisa de mais líderes intelectuais como foi Newton da Costa.”

O reitor da Unicamp, Antonio José de Almeida Meirelles, lamentou a morte do renomado filósofo e ressaltou seu importante papel como impulsionador da ciência nacional. “Criador da lógica paraconsistente, o matemático Newton da Costa contribuiu de forma relevante para o avanço do conhecimento em sua área e para a propagação do nome da Unicamp no cenário internacional. Sua morte representa uma grande perda não apenas para a Universidade, que lhe conferiu em 2009 o título de professor emérito, mas para a ciência brasileira de modo geral.”

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Assista à reportagem por ocasião da cerimônia de entrega do título de professor emérito, em 2009:

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